Poucos contos e alguns trocados.

sexta-feira, 24 de abril de 2015

Sereias

As sereias são, na mitologia grega, seres metade pássaro e metade mulher, cujo canto maravilhoso atraía os mergulhadores para, então, devorá-los. A forma atual da lenda (metade mulher, metade peixe), foi tomando corpo na Idade Média, provavelmente influenciada pela mitologia nórdica.

Os gregos também tinham umas mulheres da água, as nereidas, filhas do deus Nereu (antigo deus da água, que reinou antes de Poseidon). Elas eram ninfas aquáticas.

Tentei imaginar a Ariel metade pássaro. Ia ser difícil fazer um troço fofinho
(Pensando bem, faz bastante sentido que seres com um canto maravilhoso sejam metade pássaros, não? Porque, até onde eu sei, peixe não canta. Baleias e golfinhos sim, mas não são peixes. Existe a ordem dos sirênios, que engloba os peixes-boi, que, até onde me consta, também não cantam. E tem uma banda chamada Sirenia)

E esse é o clipe da música de que eu vou falar hoje:

 
Eu amo essa música 


A música vem do álbum Destination Set to Nowhere, do Vision Divine, um álbum conceitual que narra a história de uma população humana que, cansada das corrupções da Terra, parte em busca de um planeta no qual possam viver em paz. Eles encontram o planeta mas, pouco depois de terem se estabelecido lá, começam a surgir os mesmos problemas que já enfrentavam na Terra. Quem lembrou da Arca de Noé põe o dedo aqui



Durante a viagem - que é extremamente longa, afinal, é uma viagem pelo espaço em busca de um planeta que forneça condições para a vida humana - o personagem principal - o sujeito que tem a ideia de levar a galera pra passear - começa a "delirar". Antes da letra da música, tem uma pequena introdução (no encarte do disco):

Um caminho tão longo, um tempo tão longo. Apesar de sabermos que isso ainda é o comecinho, estar perdidos no espaço por todos esses anos está minando nossa sanidade. Nós quase perdemos a esperança e todo esse silêncio está me trazendo estranhas sensações: às vezes, quando eu me fecho no meu quarto, tentando dormir, eu penso sobre Ulisses e sua busca interminável na volta para casa... às vezes eu pareço ouvir vozes me chamando pra fora daqui, como sereias nos chamando de suas luas [tradução minha, beeeeem livre]
E a música:

"If I close my eyes I can hear voices like a whisper
Someone's calling
Like old mermaids from their moons
Singing melodies to those who pass by, then surrender
My reason's falling..."

Algo como "Quando fecho meus olhos, posso ouvir vozes como um sussurro
Alguém está chamando
Como velhas sereias de suas luas
Cantando melodias para aqueles que passarem, então os surpreendem
Minha razão falha"

Depois ele diz "Like Ulysses and his sailors
Now we face our Odyssey
(...)
Trying to keep our sanity"

"Como Ulisses e seus marinheiros
Agora enfrentamos nossa Odisseia
(...)
Tentando manter nossa sanidade"

Ulisses, pra quem não sabe, é o herói grego conhecido por sua inteligência. Ele, após a guerra de Tróia, que durou dez anos, mata um ciclope, desafiando Poseidon, pai e protetor dos ciclopes. Por isso, o deus do mar o persegue, atrasando sua viagem de volta para casa, que acaba durando dez anos. 

No episódio a que a música se refere,  Ulisses passa pela ilha das sereias e, desejando ouvir seu canto sem morrer, manda seus marinheiros taparem os ouvidos com cera e o amarrarem ao mastro do navio, e não o soltarem em hipótese alguma. Assim, ele pôde curtir a sonzeira. 



No clipe, como vocês devem ter percebido, o rapaz se acorrenta para não ser levado pelas mulheres que o atraem.

E a Iara, do folclore brasileiro, também é uma sereia. Ela atrai os pescadores, que acabam morrendo afogados. Na Wikipedia,  diz que, no princípio, o personagem era masculino e também devorava os pescadores. A versão feminina é posterior, provavelmente influenciada pelos mitos europeus. Eu não sabia disso. Não manjo nada de mitologia tupiniquim. 


E tem a música Iara, da excelente banda brasileira Aquaria:


 
Eu também amo essa música



O legal dessa música é que ele conta a partir do ponto de vista do moço que se afoga (eu deduzo). Curtam só um pedacinho da letra:

"Take my hand
show me where the river ends
I look into your eyes and see what I have never seen
Hold me now
Love me to the end of dawn
I look into your eyes and feel I'm living in a dream"


"Pegue minha mão
Mostra-me onde o rio termina [e morreu]
Eu olho em teus olhos e vejo o que jamais vi
Abraça-me agora
Ama-me até o fim da alvorada
Eu olho em teus olhos e sinto que estou vivendo em um sonho"



Existe uma interpretação para o mito da sereia, de que ele representaria a sexualidade feminina. A sociedade europeia é patriarcal, ou seja, os homens é que contam as histórias. Não existe a voz da mulher falando por si mesma: eu tenho tais e tais desejos, eu penso assim ou assado, eu sinto isso ou aquilo. Por conseguinte, a mulher é o desconhecido e tudo o que é desconhecido é ameaçador. 

Portanto, os homens representam a mulher usando a sexualidade como modo de controlar os homens, não de obter prazer. Pensem em mulheres dominadoras e sexys da literatura (e filmes mais recentes, com pouquíssimas exceções). Elas fazem sexo, encantam os homens, mas com o intuito de obter vantagens, e não prazer. A imagem da moça que transa com um sujeito rico pra engravidar e "dar o golpe da barriga" é exatamente a mesma coisa. Ninguém pensa que ela transou porque tava afim de transar - simplesmente - e engravidou porque - ué - porque transou.

Uma dica, homens: as mulheres na vida real não são assim. Aqui tem algo sobre isso, sobre as mulheres de games e super-heroínas que usam roupas minúsculas e pouco confortáveis para lutar - algumas inclusive tiram partido de seu belo corpo para ajudar a vencer lutas!

Bom, por hoje é só. Pra finalizar, deixo um link dum blog que tem uma matéria bem interessante sobre o tema: http://merafantasia.blogspot.com.br/2007/10/sereias.html

quarta-feira, 22 de abril de 2015

Livros - 8/04 a 22/04

Vou resenhar juntos os quatro livros que peguei na biblioteca no dia 8 de abril.

 

Um Corpo na Biblioteca - Agatha Christie


Cotação: curti.

O detetive principal da trama é uma mulher! Achei muito legal, porque normalmente livros/filmes policiais retratam o detetive como um homem, ou, no máximo, uma dupla, em que a mulher ocupa papel secundário. Miss Marple é uma velhinha solteirona com um raciocínio e capacidade de observações equivalentes aos do Sherlock Holmes (ou do Homem que Calculava). Ela é capaz de tirar conclusões baseada nas unhas da moça morta!!!

A trama é bem intrincada, cheia de personagens (chega até a confundir), mas a conclusão final é baseada em um dado que não é sequer sugerido no livro. Dessa maneira, tu simplesmente não tem como adivinhar o final, tem? Acho que nem com a capacidade de observação da Miss Marple. O fato é que eu já supunha algo parecido com o que aconteceu (só errei os personagens, e por causa desse defeito na narrativa).

 

Noite de Reis - Shakespeare e A Décima Segunda Noite - Luís Fernando Veríssimo

Cotação: "Não que eu queira me comparar a Shakespeare. Shakespeare era bem mais magro." (Luís Fernando Veríssimo)

Estou resenhando juntos porque o livro do Veríssimo é inspirado na comédia Shakespeareana, e ambos têm a mesma história. Basicamente, é a de uma moça que, separada do irmão gêmeo, Sebastião - por infelicidade - disfarça-se de homem para trabalhar e se apaixona pelo patrão, que a/o manda cortejar a Olívia, mulher por quem o patrão é apaixonado.

Que confusão, né? Isso tudo é pra ser engraçado. E é. Além da confusão central, acontecem outras, envolvendo o irmão gêmeo da moça (que é confundido com ela), o mordomo da Olívia - que acaba acreditando que a Olívia o ama, o "Lorde Bochecha" - sujeito que é apaixonado por Olívia e amigo do tio dela, Maria - criada ou tia de Olívia, dependendo a versão que se lê - e Antônio - amigo de Sebastião.

E ainda tem o Bobo (sempre tem um bobo nessas comédias) que virou o "Festinha" no A Décima Segunda Noite. Esses bobos são muito engraçados, embora todo o mundo os ache loucos, mas me parecem muito sãos. Eu tenho pra mim que, naquele tempo, tinha um povo que se fingia de louco só pra descolar um empreguinho.

No livro do Veríssimo, o narrador é um papagaio (!) que também se apaixona pela personagem central da comédia (!!), Violeta (que Shakespeare chama de Viola), e que cita Flaubert e Shakespeare o tempo todo (!!!). Tem um punhado de gente que não acha a menor graça nisso, mas eu acho hilário. Tem uma hora que ele fala "longe de mim me comparar ao xixi do Proust" hauahauah
Outra coisa bem engraçada nesse narrador-papagaio é que ele está falando pra um gravador, pra um bando de jovens que o entrevista. Os jovens não aparecem, mas ele conversa com eles. Tem horas que a fita acaba e ele fica "merda, de novo essa fita acabando"

O livro do Shakespeare também é engraçado, mas a linguagem é erudita demais, aí tu perde tanto tempo tentando entender o que tá escrito que nem dá vontade de rir (embora eu tenha rido de algumas coisas - não me lembro de quais, mas eu ri). Essa edição é da década de 50, e taqui a prova, pra quem não acredita:
Foi doado em 57, pensem.
 As traduções mais recentes são mais palatáveis. Me lembro um dia em que o professor de teoria tinha mandado a gente ler o Hamlet, e eu li a versão do Millôr Fernandes (recomendo essa) e uma colega minha tinha pegado uma tradução antiga (década de 50, por aí). Eu dei uma olhada no livro dela e não entendi patavinas! Shakespeare tem que ser numa linguagem de gente! O cara escrevia peças para serem representadas pra um bando de bêbados, ia ser muito erudito? Não ia.

Enfim. Achei que eu ia escrever horrores sobre os dois, mas não tenho muito o que dizer, afora que eu gostei, muito. E eu adotaria esse papagaio, de boas, só pra bater uns papos com ele.


A Cidade e as Serras - Eça de Queirós


Peguei esse livro só pra poder fazer essa piada

cotação: Esse aqui tá difícil de ler

Chegou o dia da entrega e eu não terminei. Não sei se vale a pena renovar.

domingo, 19 de abril de 2015

O Preço da Eternidade


Imagem catada na internet

Eae, gente! Eu finalmente consegui digitar esse conto! Já faz um bom tempo que o escrevi, usando dois assuntos sobre os quais eu sempre quis discorrer: a maldição pelo assassinato de um unicórnio e um conto de terror. Não sei se ficou terrorífico que chega, mas pelo menos fala da maldição. 

E, de quebra, já cumpri uma das metas para Abril, digitando o bendito.
Enfim. Ei-lo.

O preço da eternidade


Matar unicórnios dá azar. Mais do que azar, matar um unicórnio é sinal de uma desgraça medonha e iminente. Qualquer um sabe disso.

Mas o que muitos não sabem é que essa história serve para encobrir uma verdade terrível: há um ritual feito com sangue de unicórnio que dá a quem o fizer a imortalidade – e plena saúde - por toda a eternidade. Mas há um preço por tudo isso, é claro. Durante esse ritual, a pessoa perde o poder sobre a própria alma.

É uma história terrível, e poucos malucos arriscar-se-iam para confirmar que fosse verdadeira. Na verdade, os bardos não costumam contá-la justamente para evitar que esses mesmos malucos se atrevam. Imaginem os perigos que podem advir de um ser imortal sem alma zanzando pelo mundo.
Portanto, eu não ouvi essa história de um bardo. Ouvi-a há anos, de uma bruxa, provavelmente a pessoa que conheci mais próxima dos tais “malucos”.

Nunca contei a ninguém, mas agora recordo a velha história. Seria uma tentação? Lanço um olhar à minha esposa, deitada na cama, derretendo-se em febre. Ela, inconsciente, aperta minha mão e delira e geme. Seu ventre inchado realça mais ainda sua magreza mortal. As últimas palavras que ela disse antes de perder a consciência, há dois dias, ainda ecoam na minha mente: se for preciso escolher entre mim e o bebê, escolham o bebê. O médico esteve aqui e disse que, provavelmente, não haverá escolha possível.

Lembro-me da bruxa “vida e saúde eternas...”

Aperto a mão de minha mulher. Dedos finos, longos, pálidos, sem esperança, sem vida. Preciso deles. Deles cheios de força novamente, acariciando meus cabelos, de poder beijá-los outra vez. 

Só dependia de mim.  De que me valeriam a alma imortal e o paraíso celeste sem tudo o que me importava?

Decidi, enfim. Deixei-a aos cuidados de meus sogros e prometi regressar com a cura. Minha sogra chorava. Seu marido bateu nas minhas costas e me pediu para voltar logo. 

Meu coração ficou mas eu parti em busca do sangue do unicórnio que permitiria aos três sermos felizes para sempre.

-x-x-x-

Por três dias vaguei, até entrar em uma floresta estranha. Era ela, a floresta em que encontrei o unicórnio, depois de uma semana. Ele estava lá, exatamente como eu o imaginara. Um belíssimo e esguio cavalo branco, com um gigantesco e pontudo chifre na testa.

Enfim, a criatura! A criatura do sangue de prata, da minha salvação e de todos que amo.

O ritual era simples. Bastava fazer um corte vertical no pescoço dele e colher o sangue, que finalmente nos daria a vida eterna. Rápido, antes que a criatura escape.

Mas os meus membros estavam pesados, como acorrentados. Eu não podia dar sequer um passo. E o bicho impávido diante de mim, como uma tentação. Uma tentação à qual eu tinha preguiça de ceder. Não que não quisesse, eu a desejava como um pecador à salvação, mas meus desejos estavam adormecidos, eram apenas uma lembrança.

Quando enfim esbocei reação, uma voz desconhecida invadiu minha mente. Seria o unicórnio? Ele não falava. Talvez um poder místico, minha consciência ou até o próprio Deus.

“Vais matar uma criatura inocente para satisfazer teu desejo?... Olha pra ele, nunca te fez mal...”

Não consegui replicar. Meus dedos estavam amolecidos. A voz continuou:

“E tua alma imortal? Inocente como esta criatura... Vais sacrificá-la também?”

A minha alma estava em um catre, em casa, repleta de nosso filho. Eles eram minha alma, e mais nada, nem Deus, importava. Eu já havia sacrificado a vida celeste, mesmo antes de ameaçar o unicórnio. Não retruquei, porém. Fixei o olhar na criatura inocente diante de mim – tão inocente que seu único pecado fora ter algo que eu desejava. Pecado, porém, suficiente para ser condenado.

Mantive a ideia de rasgar o pescoço do bicho mas, imóvel pela minha própria incapacidade, esperei a grave voz misteriosa tornar a me admoestar.

Mas não. Deus – se é que era realmente Ele – cansara-Se de mim. Qualquer coisa seria inútil.

Pensei no meu inocente filho, que ainda nem nascera, e quase recuei ante a ideia de que seu primeiro alimento seria o sangue da criatura sagrada. A visão me aterrorizou, os pequenos lábios manchados de rubro puro, o choro de fome, o leite pálido que ele sorveria em seguida, de meu anjo de alma já corrompida. Os olhos dela deixariam o bebê para olhar para mim, e seus lábios sujos de sangue sorririam, livres e salvos, enfim.

Tive um novo sobressalto, lembrando dos longos dias de doença dela, do sangue e da febre, do ventre crescendo e os ossos surgindo sob a pele magra. Ela iria morrer.

Meus dedos me obedeceram, enfim. Tomei o punhal da bainha e avancei no bicho, com violência, fúria, sede. Talvez ódio, como se meu anjo estivesse naquele estado por causa de uma maldita criatura mágica.

E nem a voz de Deus na minha cabeça “tolo imbecil!” me deteve.

Cravei o punhal logo abaixo da mandíbula do bicho e deslizei em direção do ombro, num golpe só. Prata líquida esguichou e escorreu pela minha mão, enquanto o unicórnio me lançava um último olhar humano e a voz desfalecia em minha mente.

Sorri insano. Finalmente. Minha doce esposa e meu filho viveriam para sempre, abençoados pela maldição do unicórnio.

Provei do sangue, após recolhê-lo num odre, e não senti absolutamente nada de diferente. Bebi alguns goles e uma leve tontura se apossou de mim, mas logo eu não tinha mais nada. A imortalidade era só isso? Com o mesmo punhal, fiz um corte comprido em meu pulso. Esfreguei o sangue prateado ali. 

Quase imediatamente, ele fechou por definitivo, restando apenas um fio metálico ali, a prova da marca.

Disfarcei o odre em minha bagagem e me preparava para partir, quando senti uma forte ânsia de vômito. Caí de joelhos, havia algo preso em minha garganta, que meu corpo fazia questão de expelir. Talvez o sangue. Mas era pastoso e me impedia de respirar.

Quando enfim consegui vomitar, escorreu de minha boca um enorme fio pastoso, que não terminava. 

Fiquei ali, sofrendo, até conseguir pôr tudo pra fora, transbordou pelos meus olhos, abriram-me cicatrizes antigas, que passaram a sangrar prata, e até a mais recente, e eu não sabia o que fazer, estava me desfazendo em mercúrio, ali mesmo, diante do corpo do unicórnio que se decompunha aos poucos. 

Se houvesse alguém naquela floresta, fugiria aterrorizado de meus gritos guturais de sofrimento atroz, mas não, eu estava completamente só, como vim ao mundo, e era assim mesmo que o ia deixar. Meu único consolo era que morreria ao mesmo tempo em que ela o faria, minha doce esposa. 




Não soube quanto tempo passou, até que acordei completamente recuperado. Não havia cadáver nenhum diante de mim, nem sangue argênteo, só meu odre profano. Suspirei, tomando forças pra me levantar, o que, para minha surpresa, foi incrivelmente fácil. Senti-me leve, como há anos não me sentia. Como se houvesse nascido de novo

Meu coração exultou de felicidade. Parti o mais rápido possível, encontrando meu cavalo onde o havia deixado. Minha mente só tinha espaço para a visão da minha esposa saudável, exatamente no dia em que nos conhecemos, uma festa da aldeia, todos ao redor do fogo, ela dançando, os olhos castanhos brilhando, os cabelos trançados até a cintura, a boca de pêssego maduro, as ancas largas, o corpo macio.

Ela sorrira pra mim e eu decidira fazê-la a mulher da minha vida. Para sempre

Nosso bebê surgiu depois em meus pensamentos, pequeno e gorducho, os olhos da mãe. Não consegui saber o sexo, mas ele roía a própria mão, travesso. Havia leves cachinhos muito claros no topo de sua cabecinha afável.

Minha amada, com ele no colo, sorria e lhe dizia “dá tchau pro papai, dá”.

Parei, fulminado por um raio. Ele tinha olhos de prata!

Não consegui reagir por horas. Meu cavalo me carregou, paciente, até a casa que sabia ser nossa. Durante esse tempo,não me abandonou a visão de minha mulher com nosso filhinho no colo, ensinando-o a dar tchau para o papai.

Quando enfim voltei a mim, esporeei o cavalo e parti a toda velocidade, disposto a chegar o quanto antes.

No amanhecer do quarto dia alcancei o lar e a primeira pessoa que vi foi meu sogro cultivando algumas flores que sua filha diligente havia plantado embaixo de nossa janelinha.

Gritei o nome dele, que apenas ergueu os olhos, sem dar muita atenção. Apenas abandonou o ofício quando desci do cavalo e fui até ele.

-Como ela está? – interroguei, ansioso.

-Lá dentro, descansando – respondeu misterioso.

Meu coração disparou. Então ela estava melhor? Entrei quase correndo na casa. No nosso quarto, a maior de todas as surpresas: minha amada estava deitada e, sobre ela, um lençol encharcado de sangue. Havia sangue no chão, nas paredes, como se algum animal monstruoso tivesse destroçado algo ali.

Não pude me mover. Meu sogro adentrou o quarto em seguida: não disse que ela agora descansa? Descansa para sempre.

Nosso bebê morto jazia nos braços esqueléticos da mãe.

Minha voz estava amortecida, mas eu não consegui chorar. Nunca mais pude chorar, depois do ritual.

-Quando...? – não sei de onde tirei forças para perguntar.

O velho beijou a testa da filha, olhou demoradamente o neto e, enfim, respondeu:

-Há três dias, quando o bebê nasceu.

Exatamente quando eu os vira dar tchau para mim!

Aquilo não podia estar acontecendo. Não... Podia...

O avô se aproximou de mim de cabeça baixa:

-Ela era linda. A mais bela das moças da aldeia. De coração mais puro. E você... Você a enfeitiçou! Você a matou! Maldito!

E o velho atravessou meu peito com uma velha espada de família. Eu precisava mesmo morrer.

Mas não senti quase dor. Eu não iria morrer. Nunca mais.

Ele se apavorou brevemente, mas depois deu um sorriso cheio de sarcasmo:

-Você não vai poder se juntar a ela... Jamais.

E tirou a própria vida, diante de meus imortais olhos de prata.  

 -x-x-x-x-x-x-x-

Vale um comentário?

terça-feira, 7 de abril de 2015

Vermelhos



Acho que todo o mundo sabe que as cores de carro mais vendidas no Brasil são prata, branco e preto. As revistas especializadas dizem que é porque vivemos num país tropical onde tudo já é colorido etc etc etc. Eu acho que é porque brasileiro compra carro já pensando em vender, e é muito mais fácil vender um carro prata do que um amarelo-canário-neon. Leiam mais sobre isso aqui.

O vermelho, por incrível que pareça, também é uma dessas cores (embora em número expressivamente menor que as outras três) porque, bem, é uma cor sólida (não encarece o preço final do veículo). O que me chamou a atenção foi que, no sul do Brasil, o vermelho vende mais que em outras regiões do país (infelizmente, não encontrei nada relacionado a isso na internet nem a revista que trazia essa matéria). A revista não sabia o porquê, mas eu  sei:


 Além da quantidade enorme de carros vermelhos com adesivos colorados (às vezes gigantescos, vi um que o adesivo era do tamanho do capô), tem uma quantidade significativa de carros vermelhos com o adesivo do Grêmio!

(pausa dramática)

Isso, além de bizarro, requer atenção especial. Por que diabos um gremista compraria um carro vermelho e o decoraria com um adesivo do Grêmio? (não, eu nunca vi um colorado com um carro azul). Elenquei algumas hipóteses para explicar isso:

1. O sujeito comprou o carro usado. Era um bom carro, um bom preço... Não ia deixar de comprar por causa da cor, ia?

2. Os gremistas têm uma espécie de "inveja" do Ínter. Essa hipótese não é minha, mas de um amigo meu que, por incrível que pareça, não é colorado (nem gremista, claro).

3. Essa é de um conhecido, gremista, que tinha um Scort vermelho. Ele dizia que "vermelho é pra gente usar". Ele tinha comprado o carro usado. 

A minha hipótese continua sendo a mais provável. Enfim. Esse é uma assunto digno de estudo. Daria um tcc de psicologia (ou de marketing).

Adendo pra evitar gremistas me xingando (muito): no hino do Inter tem uma parte que fala "Colorado de ases celeiro, teus astros cintilam no céu sempre azul". 

Mais vermelhos


Eu sou suspeita, mas andei pensando e acho que o vermelho é a cor por excelência

Antes que vocês me prendam em uma camisa de força, eu explico. Quando alguém fica vermelho (por vergonha, sol, calor, sei lá), dizemos que a pessoa está corada, isto é, com cor (que poderia ser qualquer cor, mas é o vermelho). Aí alguém fala que isso é óbvio, afinal, seres humanos não ficam, sei lá, azuis. Quando ganham cor, ficam vermelhos, por causa do sangue. Mas eu digo que alguém que ganha cor no sol fica bronzeado - e olha aí, o nome da cor!

Adendo posterior, mas interessante: em latim, color, coloris, também significava "cor do rosto, tez".

Depois, tem uma plantinha usada pra dar cor na comida, que se chama colorau ou colorífico. A cor? Vermelho! Pra quem não conhece, o fruto é uma espécie de casca peluda que tu abre e tá cheia de sementinhas vermelhas. A cor (color, do latim color, coloris) é o vermelho!

Quando eu era criança, eu amava essa planta



E tem ainda a palavra colorado, que designa o Internacional de Porto Alegre, quem torce pra ele e o nosso herói Chapolin e significa - adivinhem! - vermelho.

O vinho tinto - tinto, tingido, com cor - também é vermelho. 

Parece bem vermelho pra mim
Adendo não importante, mas divertido: nas línguas neolatinas, "roxo" significa vermelho. Rojo, em espanhol; rosso, em italiano; roso, em romeno. Em português, obviamente, não. O nosso "vermelho" vem de vermiculum, que signfica "vermezinho", devido a um inseto que produzia essa cor, usada para colorir vestes romanas. Usar vermelho, em Roma, era pura ostentação, porque imaginem o preço que devia ser pra tingir uma roupa toda usando a cor de um inseto! Leiam mais aqui.

Assim, retorno (ainda que brevemente) à minha época saudosa de escrever bobagens.

sábado, 4 de abril de 2015

A Casa dos Espíritos - Isabel Allende


Peguei esse livro porque sempre tive vontade de conhecer a autora chilena (que nasceu no Peru), que é tão famosa. Peguei e comecei a ler no mesmo dia.

E o que eu achei? Viciante. Daqueles que tu simplesmente não consegue largar. Não que seja absurdamente bom, mas tem alguma coisa que prende, como o Cem Anos de Solidão, do Gabriel García Márquez. Talvez seja a linguagem (achei ambos com uma linguagem muito parecida, como se fossem escritos pelo mesmo autor).

Os dois livros têm temas bem parecidos, contando a saga de uma família ao longo do tempo. Paralelamente, os anos passam, surgem novas tecnologias, as cidades se desenvolvem, pessoas nascem, têm filhos, morrem. Também se narram vários desastres naturais, como chuvas torrenciais, secas e, no caso do A Casa dos Espíritos, um grande terremoto. Os dois até mostram uma praga de formigas. E agora me lembrei de que os dois trazem uma garota absurdamente bela, que hipnotizava os homens e era meio alheia a tudo.

No final,o livro se torna mais histórico, contando um pouco sobre o golpe e a ditadura militar no Chile. Na orelha do livro há uma citação da autora, afirmando que as informações são verídicas, resultados de reportagens que ela mesma realizou. O que me apavorou mesmo foi a semelhança do cenário político pré-golpe descrito no livro com o atual cenário político brasileiro. O mesmo terror do comunismo, o mesmo pensamento da elite e classe média, a mesma imprensa minando o governo, e até uma greve de caminhoneiros. Com a diferença de que nós, hoje, já sabemos como a história termina. 

Depois desse, eu li A Redoma de Vidro, de Sylvia Plath, em que a personagem principal tem o mesmo problema que Alba, uma das personagens de A Casa dos Espíritos. Ambas, em momentos importantes das suas vidas,  têm um sangramento vaginal intenso, que molha toda a sua roupa, chega aos pés e não quer parar. Esther, a personagem de Plath, sofre o sangramento após sua primeira vez e Alba, com o estresse de ficar sitiada pela polícia durante uma greve de estudantes. Deve ter ensaios e ensaios sobre isso por aí.

Outra coisa que me chamou a atenção é que, nos países hispanófonos, as pessoas têm o costume de repetir os nomes dos pais nos filhos. No Cem Anos de Solidão tu até se confunde, porque tu não sabe quem é quem. No A Casa dos Espíritos, quem se opõe a esse costume é Clara, que tinha o costume de anotar os acontecimentos em "cadernos de anotar a vida", dizendo que nomes repetidos causam confusão nesses cadernos. Por isso, sua filha se chama Blanca e sua neta, Alba. Ela dá um jeito de seguir a tradição sem confundir as suas anotações, usando sinônimos para nomear as crianças.

Ainda tou pensando se vale a pena pegar outro livro da autora pra ler. 

Adicionem esse livro na sua lista de desejos do Skoob, se quiserem.
 








sexta-feira, 3 de abril de 2015

TAG: Meu blog e eu

Fui indicada pela Andy do Sábado Chuvoso pra responder a  essa tag. Não vou indicar blog nenhum para respondê-la.


1. Responder as 8 perguntas da tag;
2. Indicar 8 blogs para responderem a tag;
3. Linkar de volta quem te indicou.

Perguntas

1. Por que você criou o blog?
 Eu queria postar contos e crônicas, mas faz eras que não posto nenhum conto ou crônica aqui "/ O motivo é que eu acho os meus escritos muito ruins, e tenho andado sem condições de escrever nada (minha mente não colabora). Vamos ver se posto um conto esse mês

2. Como você escolheu o nome do blog? 
 Não me lembro exatamente, mas lembro que foi difícil. Pensei por um bom tempo, sem ideia e, um belo dia, o nome me caiu como um meteoro. Eu queria  algo que tivesse um trocadilho e me ocorreu de relacionar conto (gênero literário) e conto (dinheiro). Foi na mesma época que eu ajudei a nomear a page do Rogério, Power of Metal. Nós dois discutimos juntos um pouco sobre isso.


3. Quando seu blog foi criado?
Eu já pretendia criar um blog, mas só criei efetivamente depois de resolver o nome. Deve ter sido pelos fins de 2012, acho. Vou olhar o arquivo do blog pra ver. Janeiro de 2013. O primeiro post é do dia 6.

4. Qual o principal assunto que o seu blog aborda?
Ultimamente? Roupas para Monster High! hauahauhauahauha Também tem umas resenhas de livro e tags que a Andy me marca. Tenho muita saudade de escrever besteira como eu fazia antes. 

5. Quem fez o layout?
Eu mesma, com a base de layout do blogger e com as cores que eu mais gosto. Rosa com rosa hauhauah


6. Fale um pouco do layout, o que ele representa?
 Acho que já falei, é porque eu gosto das cores. Não representa porcaria nenhuma, só é fofo

7. Pensa em fazer do blog um trabalho?
 Não, gosto de tê-lo como hobby mesmo.

8. O que você diria para as blogueiras que começaram agora?
Eu não tenho conselhos pra dar. Acho que seria algo como "façam o que tiverem afim, porque fica muito mais divertido"       

Enfim, agora me resolvi a escrever umas besteiras. Vamos ver o que sai.